Por Eduardo Sá, do Fazendo Media
Pela primeira vez em nove anos a edição impressa do Fazendo Media foi impedida de circular numa universidade. O pior é que foi num campus que tem curso de jornalismo. Apesar de ser um fato particular de nosso projeto, implica questões que tocam toda a sociedade. Levado ao extremo, pode-se dizer que sofremos censura, por outro lado, e esse ponto é o mais importante, o ocorrido sinaliza o pensamento da cúpula de uma das instituições que forma os jornalistas que levam informação à sociedade. É, portanto, um elemento fundamental que diz respeito ao bom funcionamento do regime democrático. Não existe democracia sem a circulação de ideias, e os jornalistas têm grande responsabilidade nesse sentido.
Mas primeiro vamos aos fatos. É com muita dificuldade, sobretudo pela falta de dinheiro e colaboradores, que imprimimos nosso jornal. Por isso, as últimas edições foram bimestrais, de 3.500 exemplares. A distribuição fica por minha conta e de outro colaborador, ambos remunerados abaixo do patamar de estagiário e com várias tarefas. Para tanto, deixamos os exemplares, gratuitamente, em várias faculdades do centro, zona sul e norte carioca (UFRJ, PUC, FACHA, Univercidade, UFF, Gama Filho, IFCS, UVA, etc.), além de Niterói e outros pontos culturais. A Facha, inclusive, quase fechou com a gente uma parceria de inserir alunos no nosso projeto contando as atividades como aula complementar do currículo na graduação. Não é fácil, também, manter nossa página atualizada, e ainda assim temos uma média de 20 a 30 mil visitas por mês.
Nesse cenário, fomos vetados de deixarmos nossos jornais na biblioteca e corredores da Universidade Cândido Mendes na Tijuca, zona norte da cidade. Apesar de os campus da Rua Assembleia e Av. Presidente Vargas, ambos no Centro do Rio e da mesma empresa, divulgarem nosso trabalho. Tem professores, inclusive, que nos apóiam. Fomos vetados pelo Coordenador de Apoio às Atividades Docentes, Fabiano Barbosa Netto, sob a justificativa de que o jornal tem um teor político e no expediente contém o apoio de um partido político, no caso o gabinete do deputado federal Chico Alencar (Psol-RJ).
Agora vamos por partes. O apoio de um determinado partido se deu apenas pelo fato de outros parlamentares considerados progressistas não nos ajudarem, pois o Fazendo Media já buscou auxílio em diversos gabinetes do Rio. Infelizmente esse foi o único que se dispôs ou teve condições de nos ajudar, mas essa explicação também não foi suficiente. Quanto ao teor político referido pelo coordenador, eu disse que nosso projeto nasceu com o propósito de analisar a mídia, seus interesses e manipulações nas informações, bem como desmistificar muitos dos seus métodos ao público. De nada adiantou também.
O que um jornal que busca apresentar uma alternativa a determinadas narrativas, que são produzidas sistematicamente de maneira padronizada, e atribuir uma consciência crítica aos leitores frente às notícias pode causar numa universidade? Democratizar os meios de comunicação e, por consequência, as informações é a finalidade do projeto. Finalizei dizendo que todo jornal tem lado, não existe informação apolítica ou desinteressada, inclusive nos jornais O Globo, Folha de São Paulo, O Dia, etc, que estão disponíveis na biblioteca da instituição para seus alunos. Esse princípio, aliás, é essencial dentro de uma faculdade de jornalismo.
Tudo isso não foi suficiente para a permissão da circulação de nossas ideias, e só insisti na argumentação para ver a natureza de sua justificativa. Para o coordenador, passando rapidamente a vista na nossa edição passada, que vem com matérias sobre a segurança da usina de Angra, uma reportagem sobre o fechamento pela Polícia Federal de uma rádio comunitária na favela Santa Marta, uma entrevista sobre o canal Al Jazeera (que diga-se de passagem, os estudantes de jornalismo praticamente desconhecem por falta de vontade política acadêmica), dentre outras, tudo isso era político. Seus alunos, na sua visão, portanto, não deveriam ter acesso.
Mas o que não é político, em termos de conteúdo jornalístico, afinal? Quem, sobretudo dentro de uma academia, o ambiente do pensar, determina isso? Há parâmetros? Informações mais convenientes e outras não? Qual o critério? E o ato de fazer essa seleção, sem consultar os alunos, não é um ato político? Darci Ribeiro, grande educador brasileiro que tanto lutou pelas universidades, definia a universidade como a casa da consciência crítica. Um lugar, por definição, para pensar a melhoria do presente. O que ele, junto com Paulo Freire, outro educador excepcional, que defendia a comunicação compartilhada sem privilégios, diria de tal postura no meio acadêmico?
Não se trata aqui de fazer uma retaliação à figura do coordenador, mas suscitar reflexões sobre o papel da universidade, sobretudo os cursos de jornalismo. Se o aluno não tem acesso a uma informação crítica, sob critérios estabelecidos sem o seu menor conhecimento, qual a função daquele ensino? Formar jornalistas apolíticos e submissos ao mercado, sem ao menos apresentar uma alternativa para o meio em que estão se formando? Formar profissionais isentos do exercício de reflexão e conformistas? Ou, na pior das hipóteses, simplesmente se preocupar com o pagamento das mensalidades e fugir a qualquer questionamento dos alunos? Porque o diálogo, pressuposto básico da democracia, é prejudicado sem a circulação de informações. E quanto mais informado o aluno, mais consciente ele fica e pode procurar mudar as suas condições. Inclusive exigir seus direitos, sobretudo o direito a comunicar e ser comunicado, vital num curso de comunicação social. Caminhando no sentido contrário, é o conceito de cidadania que vai por água abaixo. E são os próprios alunos que saem perdendo no final da história, os mesmos que sustentam financeiramente a universidade e mantém sua reputação na área de atuação.
(*) Eduardo Sá é jornalista e atual editor do Fazendo Media.
Mas primeiro vamos aos fatos. É com muita dificuldade, sobretudo pela falta de dinheiro e colaboradores, que imprimimos nosso jornal. Por isso, as últimas edições foram bimestrais, de 3.500 exemplares. A distribuição fica por minha conta e de outro colaborador, ambos remunerados abaixo do patamar de estagiário e com várias tarefas. Para tanto, deixamos os exemplares, gratuitamente, em várias faculdades do centro, zona sul e norte carioca (UFRJ, PUC, FACHA, Univercidade, UFF, Gama Filho, IFCS, UVA, etc.), além de Niterói e outros pontos culturais. A Facha, inclusive, quase fechou com a gente uma parceria de inserir alunos no nosso projeto contando as atividades como aula complementar do currículo na graduação. Não é fácil, também, manter nossa página atualizada, e ainda assim temos uma média de 20 a 30 mil visitas por mês.
Nesse cenário, fomos vetados de deixarmos nossos jornais na biblioteca e corredores da Universidade Cândido Mendes na Tijuca, zona norte da cidade. Apesar de os campus da Rua Assembleia e Av. Presidente Vargas, ambos no Centro do Rio e da mesma empresa, divulgarem nosso trabalho. Tem professores, inclusive, que nos apóiam. Fomos vetados pelo Coordenador de Apoio às Atividades Docentes, Fabiano Barbosa Netto, sob a justificativa de que o jornal tem um teor político e no expediente contém o apoio de um partido político, no caso o gabinete do deputado federal Chico Alencar (Psol-RJ).
Agora vamos por partes. O apoio de um determinado partido se deu apenas pelo fato de outros parlamentares considerados progressistas não nos ajudarem, pois o Fazendo Media já buscou auxílio em diversos gabinetes do Rio. Infelizmente esse foi o único que se dispôs ou teve condições de nos ajudar, mas essa explicação também não foi suficiente. Quanto ao teor político referido pelo coordenador, eu disse que nosso projeto nasceu com o propósito de analisar a mídia, seus interesses e manipulações nas informações, bem como desmistificar muitos dos seus métodos ao público. De nada adiantou também.
O que um jornal que busca apresentar uma alternativa a determinadas narrativas, que são produzidas sistematicamente de maneira padronizada, e atribuir uma consciência crítica aos leitores frente às notícias pode causar numa universidade? Democratizar os meios de comunicação e, por consequência, as informações é a finalidade do projeto. Finalizei dizendo que todo jornal tem lado, não existe informação apolítica ou desinteressada, inclusive nos jornais O Globo, Folha de São Paulo, O Dia, etc, que estão disponíveis na biblioteca da instituição para seus alunos. Esse princípio, aliás, é essencial dentro de uma faculdade de jornalismo.
Tudo isso não foi suficiente para a permissão da circulação de nossas ideias, e só insisti na argumentação para ver a natureza de sua justificativa. Para o coordenador, passando rapidamente a vista na nossa edição passada, que vem com matérias sobre a segurança da usina de Angra, uma reportagem sobre o fechamento pela Polícia Federal de uma rádio comunitária na favela Santa Marta, uma entrevista sobre o canal Al Jazeera (que diga-se de passagem, os estudantes de jornalismo praticamente desconhecem por falta de vontade política acadêmica), dentre outras, tudo isso era político. Seus alunos, na sua visão, portanto, não deveriam ter acesso.
Mas o que não é político, em termos de conteúdo jornalístico, afinal? Quem, sobretudo dentro de uma academia, o ambiente do pensar, determina isso? Há parâmetros? Informações mais convenientes e outras não? Qual o critério? E o ato de fazer essa seleção, sem consultar os alunos, não é um ato político? Darci Ribeiro, grande educador brasileiro que tanto lutou pelas universidades, definia a universidade como a casa da consciência crítica. Um lugar, por definição, para pensar a melhoria do presente. O que ele, junto com Paulo Freire, outro educador excepcional, que defendia a comunicação compartilhada sem privilégios, diria de tal postura no meio acadêmico?
Não se trata aqui de fazer uma retaliação à figura do coordenador, mas suscitar reflexões sobre o papel da universidade, sobretudo os cursos de jornalismo. Se o aluno não tem acesso a uma informação crítica, sob critérios estabelecidos sem o seu menor conhecimento, qual a função daquele ensino? Formar jornalistas apolíticos e submissos ao mercado, sem ao menos apresentar uma alternativa para o meio em que estão se formando? Formar profissionais isentos do exercício de reflexão e conformistas? Ou, na pior das hipóteses, simplesmente se preocupar com o pagamento das mensalidades e fugir a qualquer questionamento dos alunos? Porque o diálogo, pressuposto básico da democracia, é prejudicado sem a circulação de informações. E quanto mais informado o aluno, mais consciente ele fica e pode procurar mudar as suas condições. Inclusive exigir seus direitos, sobretudo o direito a comunicar e ser comunicado, vital num curso de comunicação social. Caminhando no sentido contrário, é o conceito de cidadania que vai por água abaixo. E são os próprios alunos que saem perdendo no final da história, os mesmos que sustentam financeiramente a universidade e mantém sua reputação na área de atuação.
(*) Eduardo Sá é jornalista e atual editor do Fazendo Media.
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