por Franklin Rabelo de Melo*, de Brasília
especial para a ANOTA
Outdoor pivô de polêmica divulgando à população do processo de mobilização dos PMs e bombeiros chamada de "operação tartaruga" (Foto: Agência Brasil) |
A escalada da violência no DF tá dando o que falar. Teve até matéria no Jornal Nacional. Porém, nada de novo para quem mora no Quadradinho. Para quem é de fora e ainda não conhece, existem duas brasílias: a brasília sueca, de quem mora em lugares como o Lago Norte e o Sudoeste, toda branquinha, aspone, com IDH de país nórdico e que é contra a construção de creches e quadras esportivas nas vizinhanças para evitar a circulação de gente diferenciada; e a brasília subsaariana, que fica lá pras bandas da Estrutural e do Sol Nascente, preta e nordestina, terceirizada-subcontratada-por-conta-própria, a brasília das cidades-dormitório e do ônibus lata de sardinha.
Na brasília subsaariana, morre gente todo dia. No finzinho da tarde, basta ligar a televisão e colocar um balde embaixo, para não sujar a sala de sangue. Quando o tráfico mata alguém, o cadáver vira traficante; quando é a PM que mata, a família do cadáver vende drogas presumivelmente há pelo menos 5 gerações. Morrer traficante é a regra, mesmo que o morto nunca tenha visto um baseado em vida.
Já quando morre alguém na Brasília sueca... aí o Jornal Nacional faz matéria. Simples. Se morre alguém no Primeiro Mundo, é óbvio que o fato gera uma enorme repercussão, porque mortes violentas são típicas do Terceiro Mundo, que é uma terra de gente não civilizada, pobre, preta e inculta. Imaginem um norueguês vitimado por arma de fogo! Isso não existe! Todo mundo sabe que, na Noruega, são os noruegueses que atiram contra os imigrantes...
É engraçado como nenhum especialista em segurança pública (desses que são pagos para repetir jargões), até agora, foi capaz de dar o mais óbvio dos palpites: em Brasília, o que separa a Suécia da Nigéria são poucos quilômetros. Aqui, ricos e pobres estão geograficamente bastante próximos. Tá, em Israel também. Mas em Israel, existe um muro, além de franco atiradores estrategicamente posicionados; em Brasília, não existe muro nenhum, apenas franco atiradores, e estes podem circular livremente entre um país e outro. É lógico que ia acabar dando merda.
O modelo de segurança pública do Brasil e de Brasília não funciona. Durante décadas, a estratégia da mídia, dos grandes empresários e dos governos foi responder à violência dos criminosos com mais violência policial. Essa estratégia foi acompanhada de cortes de direitos da população, ausência de políticas públicas e aumento da desigualdade social. O resultado? Mais criminalidade e mortes.
A organização de nossa polícia também não corresponde às necessidades da maioria do povo. Temos uma Polícia Militar truculenta, arrogante e que é formada para atirar primeiro e perguntar depois. Não é por acaso que mais de 70% dos brasileiros afirma não confiar na PM.
O primeiro passo rumo a uma política de segurança pública eficiente é a criação de uma polícia mais próxima da população. Isso significa que o policial precisa ter os mesmos direitos e deveres que um trabalhador comum. São coisas simples, como:
a) direito à sindicalização
b) direito à greve
c) responder por seus crimes diante da justiça comum
d) não acatar ordens superiores se o policial as julgar não condizentes com sua função
Resumidamente, precisamos desmilitarizar as polícias e criar uma polícia civil única, cujos delegados sejam eleitos pelo povo, como ocorre atualmente em países como os Estados Unidos. E essa medida precisa vir acompanhada de investimentos públicos em áreas como habitação, educação e geração de empregos, para atacar as verdadeiras causas da violência urbana.
(*) Franklin Rabelo de Melo é estudante de Serviço Social da Universidade de Brasília (UnB) e ativista da Assembleia Nacional dos Estudantes Livre (ANEL)
(Para entender a atual crise na segurança pública do Distrito Federal)
A população do Distrito Federal manifestou nas últimas semanas uma intensa preocupação com o quadro de tensionamento nas relações entre policiais militares e o Governo do Distrito Federal e com a crescente sensação de insegurança que os seguidos crimes violentos registrados nos últimos dias vêm trazendo.
O governador Agnelo Queiroz (PT-DF) fez promessas durante a campanha eleitoral e não as cumpriu, atraindo a insatisfação da Polícia Militar. Ao invés do diálogo com a categoria, houve repressão e o comando da PM foi trocado por diversas vezes em 03 anos de governo. A “Operação Tartaruga” teve início há dois meses. A atitude do governo foi apenas a de negar a existência da operação. A violência aumentava (nas áreas nobres e antes bem protegidas) e a grande imprensa, talvez ofuscada pela farta verba publicitária fazia vista grossa.
Segundo a Secretaria de Segurança Pública, do dia 1º de janeiro até a manhã de 30 ocorreram 68 homicídios, 19 a mais do que em janeiro do ano passado. Na média, são mais de duas mortes violentas por dia. O grande número de homicídios é provocado por uma operação tartaruga, iniciada em outubro de 2013, feita por alguns policiais militares para pressionar o governo a dar reajuste salarial, reestruturação da carreira e pagamento de benefícios a PMs em atividade e a policiais da reserva. O movimento consiste em diminuir a resposta em situações de crime e violência.
O crescente da violência e a radicalização da “Operação Tartaruga” fizeram com que o problema não mais pudesse ser ignorado, empurrando a imprensa a forçar o governo a agir.Diante da decretação da ilegalidade da operação tartaruga, por parte do Tribunal de Justiça do DF e dos Territórios (TJDFT), e do anúncio de punições, pelo comando da Polícia Militar e pelo Governo do Distrito Federal (GDF), as entidades representativas dos praças e oficiais brasilienses decidiram mudar de tática. Vão suspender a operação tartaruga, iniciada em outubro. Por outro lado, entram, a partir de hoje, em operação-padrão. Anunciam como alvo principal as autoridades.
Moradores fizeram uma manifestação no sábado (1º) em frente à residência oficial do governador Agnelo Queiroz (PT) para protestar contra a falta de segurança. O protesto foi organizado após a morte do jovem Leonardo Almeida Monteiro, de 29 anos, assassinado com tiro no pescoço em um assalto, na terça feira (28), quando chegava em casa. No momento do ato, Agnelo participava da entrega de novos ônibus coletivos em outra parte da cidade.O protesto reuniu cerca de 800 manifestantes, que saíram de uma estação de metrô e percorreram as ruas de Águas Claras usando camisetas brancas com a foto do jovem assassinado. Durante o percurso até a casa do governador, os manifestantes carregaram faixas com frases sobre o fim da violência e pediram que os moradores colocassem lençóis brancos nas janelas para simbolizar a paz.
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