domingo, 8 de dezembro de 2013

A Arena Corinthians e os acidentes de trabalho no Brasil

por Adriano Espíndola Cavalheiro,
Especial para ANOTA
“Eu estava lá na obra, trabalhando, mas em horário de almoço. Estávamos descendo do prédio leste para almoçar e ouvimos um barulho muito forte, chegou a tremer o chão. Um pessoal caiu. Parecia que tinha caído uma bomba. Quando saímos, olhamos para o lado direito, vimos aquela fumaça e a peça no estádio. Na hora, já olhamos o caminhão do Fábio todo amassado, veio a correria, barulho de sirene...
O estranho é que, quando levantaram a mesma peça no lado norte, cortaram no meio. Subiram uma parte de cada vez. E quando subiram a segunda parte, uma equipe de soldadores as uniram lá em cima. Mas no leste tentaram subir a peça inteira. Acho que por pressa mesmo. A Odebrecht pressiona, acelera todo mundo, dizendo que tem de entregar tudo logo. A minha empresa, que presta serviços, duplicou o efetivo nos últimos dias.
Todo mundo sabia que ia cair. Todos que sabem como funciona aquilo, via que não ia aguentar. Quando subiram a peça do outro lado, tinha o guindaste grande e mais dois pequenos subindo. E foi dividida ao meio. Desta vez, colocaram só o grande para levantar a peça inteira. Para compensar, dobraram o contrapeso. Normalmente são 12 de cada lado, desta vez 24. 
Já tínhamos medo. Esse guindaste, quando se mexe, abre um buraco de quase um metro. Aí jogam pedra pra não afundar, mas afundou. Fábio almoçava, voltava e dormia na cabine do caminhão. Naquele dia, almoçou um pouco antes para dormir mais. O pessoal da segurança falhou. Quando se sobe aquela peça, tem de isolar a área. Deixaram o caminhão ficar embaixo. Ele estava descarregando cadeiras, não tinha por que estar ali.”
O relato acima foi dado ao repórter Bruno Uliana, do site esportivo Lancenet, por um operário, que teve a identidade preservada, de uma das empresas terceirizadas contratadas pela Odebrecht, empreiteira responsável pela construção da Arena Corinthians, onde grave acidente de trabalho ceifou a vida de dois operários no dia 27.11.2013.

Ainda que as causas do acidente estejam sendo investigadas, ao teor do próprio depoimento acima, tem-se que a pressão por parte dos patrões para o aumento da produção, certamente, foi uma determinante para a ocorrência da tragédia.

Segundo o AEPS (Anuário Estatístico da Previdência Social), publicado pelo Ministério da Previdência Social do Governo Federal, no último mês de outubro, entre 2010 e 2011 houve um aumento de 6,72% no número de registros de acidentes fatais relacionados ao ambiente de trabalho. No ano de 2011, perderam suas vidas durante o exercício de suas atividades profissionais, 2.938 trabalhadores, enquanto que em 2010 foram registrados 2.753 mortes no trabalho. O relatório também aponta aumento no número de acidentes de trabalho. Em 2011 foram notificados 741.205 acidentes, enquanto que em 2010 foram contabilizados 729.413 registros de acidentes de trabalho.

No que diz respeito ao ano de 2013, de acordo com o Sintracon-SP (Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias da Construção Civil de São Paulo), triplicou o número de mortos em acidentes em obras em 2013 em comparação com 2012, na capital paulista. Até agora, 21 pessoas morreram, contra sete em 2012. Apesar de os dados serem da capital, segundo o Sintracon os números refletem uma tendência que chega à Grande SP. A quantidade de sequelados também teve crescimento, passando de 336 em 2012 para 402 neste ano. 

Para o presidente do Sintracon, Antônio de Sousa Ramalho, a pressa imposta pelas construtoras e incorporadoras na conclusão da obra é o principal motivo do aumento das mortes. "Mudou a maneira como o trabalhador da construção civil recebe. Antes, ele ganhava por hora. Agora, é por produção", 

Cleber Rabelo, operário da construção civil e vereador pelo PSTU em Belém do Pará, liderança dos trabalhadores da indústria da construção civil, denuncia que as condições de trabalho precarizadas decorrem da ganância dos empresários do setor, que para aumentarem seus lucros exploram os trabalhadores ao máximo, inclusive, impondo condições de trabalho extenuantes. As greves que eclodem na construção civil, inclusive, nos estádios da Copa, explica o vereador socialista, é a reação dos trabalhadores a essa dura realidade, na qual suas vidas são a moeda de troca para o aumento do lucro por parte das construtoras e empreiteiras. 

Encerro este texto, dizendo que a realidade nele exposta mostra que o acidente na Arena Corinthians não foi uma simples fatalidade. Ele foi fruto de uma lógica absurda do capitalismo no Brasil onde a segurança e a vida dos trabalhadores são colocadas em segundo plano, em nome do aumento da produtividade e do lucro dos patrões. 

Mostra, ainda, que tanto a segurança dos trabalhadores como o combate aos acidentes de trabalho, devem ser colocados na pauta do movimento sindical combativo, com reivindicações por ambientes de trabalho seguro presentes tanto na pauta de reivindicações nas negociações coletivas como nas greves dos trabalhadores, pois é inadmissível que os patrões e o governo não adotem medidas para aumentar a segurança e, por consequência, preservar a vida e incolumidade física dos trabalhadores. 
Com informações de 

Adriano Espíndola Cavalheiro é advogado militante e articulista da Agência de Notícias Alternativas
Mantém o blog Defesa do Trabalhador - (blog integrante da rede ANOTA) 
Contato: defesadotrabalhador@terra.com.br

A DIVULGAÇÃO, CITAÇÃO, CÓPIA E REPRODUÇÃO AMPLA DESTE TEXTO É PERMITIDA E ACONSELHADA, desde que seja dado crédito ao autor original (cite artigo de autoria de Adriano Espíndola Cavalheiro, publicado originalmente pela ANOTA – Agência de Notícias Alternativas)

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