por Almir Cezar, de Brasília (DF)
especial à Agência de Notícias Alternativas
Ministro do Desenvolvimento Agrário Pepe Vargas fala na abertura da 2ª CNDRSS (Foto: MDA) |
Esta semana acontece em Brasília a 2ª Conferência de Desenvolvimento Rural Sustentável e Solidário (CNDRSS). Contudo, apesar da fala inaugural exaltar "a construção do futuro do rural brasileiro feita de forma participativa, por Governo Federal e sociedade civil", a conferência desde o início mostra ser cheia de contradições. A abertura contou com a participação de ministros, representantes de movimentos sociais e 1,2 mil delegados, porém simbolicamente não houve representantes dos movimentos sindicais dos servidores do Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA) e Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), trabalhadores responsáveis pela implementação das políticas de desenvolvimento rural.
Até chegar à Conferência Nacional, foram realizados quase 500 encontros livres e temáticos, nos âmbitos intermunicipais, territoriais e estaduais. Com isso, mais de 40 mil moradores do campo, entre agricultores familiares, assentados da reforma agrária, povos e comunidades tradicionais, mulheres e jovens, participarão da construção do Plano Nacional de Desenvolvimento Rural Sustentável e Solidário, que norteará o rural brasileiro pelos próximos anos. No entanto, há reclamações entre esses movimentos do campo de que foi dada prioridade à participação na conferência final de entidades "mais amigas", com maior afinidade à linha política do governo.
Por sua vez, também há críticas entre os servidores. Segundo eles, em nenhum momento foi viabilizada a participação de delegados do Incra e do MDA na qualidade de servidores ou representantes de suas entidades sindicais e associativas, apesar das solicitações destas organizações e da palavra empenhada pela direção dos dois órgãos. Os servidores ainda reclamam que a maioria “esmagadora” dos delegados institucionais desses órgãos, indicados pelas chefias, são comissionados e consultores, sem vínculo com a “casa” e independência às posições do governo. Um servidor, que pediu para não ser identificado, ainda denunciou que foi "convidado a se retirar" do centro de convenções por uma chefia superior, apesar de ter sido convocado a participar por sua chefia imediata.
"Enquanto há um discurso de democratização dos espaços de decisão com a política de desenvolvimento territorial, o mesmo não se verifica internamente no MDA. Particularmente na SDT, principal porta-voz da citada política, os servidores são alijados do processo decisório, não sendo nem convidados a comparecer na conferência", afirma João Paulo, diretor da Associação Nacional dos Servidores do Ministério do Desenvolvimento Agrário (Assemda) e, curiosamente, economista lotado na SDT (Secretaria de Desenvolvimento Territorial).
Na abertura, o presidente do Conselho Nacional de Desenvolvimento Rural Sustentável (Condraf) e ministro do Desenvolvimento Agrário (MDA), Pepe Vargas, destacou que "o desenvolvimento rural precisa ser feito em sua plenitude, garantindo terra para quem não tem terra e mais terra para quem tem pouca terra”. Contrariando seu discurso, o ano de 2013 tem sido difícil para a Reforma Agrária, onde não houve a publicação de nenhum decreto de desapropriação e/ou de instalação de projetos de assentamentos, agravando o que vinha sendo o padrão do mandato da presidenta Dilma, com os piores indicadores desde o governo Collor.
"A ausência de desapropriações reflete uma decisão do governo, que negligencia há muito tempo a gestão das terras do País. Só não tiveram a coragem ainda de dizer isso à sociedade", diz Ricardo Pereira, presidente do Sindicato Nacional dos Peritos Federais Agrários (SindPFA), que organizou em setembro um protesto batizado de "Falecimento da Reforma Agrária".
Por telefone, o agrônomo do MDA lotado em Goiás, diretor do Sindicato dos Servidores Públicos local (Sintsep-GO) e conselheiro regional da Assemda, Rodrigo Souza, aponta que a criação neste ano da Agência Nacional de Assistência Técnica e Extensão Rural (Anater), tema em pauta na conferência, ao contrário do anunciado, não estimulará o desenvolvimento rural, à medida que "vulnerabiliza a fiscalização dos contratos, ao não contar com servidores efetivos estatutários, mas fiscais contratados via CLT, e portanto mais vulneráveis aos assédios dos chefes políticos, por não serem estáveis".
Faixa na entrada da sede do Incra e MDA (Foto: Anota) |
Reginaldo Marcos Aguiar, diretor da Associação dos Servidores da Reforma Agrária de Brasília (Assera/Br), complementa que “para outro modelo de desenvolvimento rural é necessário a Reforma Agrária”, e esta “só se viabilizará efetivamente, como política pública, com a valorização dos servidores do Incra e MDA”. Os servidores reclamam dos baixos salários, carência de pessoal, assédio moral, péssima condições de trabalho e da escassez dos recursos dos programas. Reginaldo ainda lembra que, em 2012, os servidores dos dois órgãos protagonizaram, segundo ele, o maior movimento na greve geral dos servidores públicos federais.
Manifestantes na entrada da sede do Incra (Foto: Anota) |
No fim da tarde de ontem (15), membros do Movimento dos Pescadores e Pescadoras Artesanais (MPP) ocuparam com uma roda de batucada a entrada desse edifício, protestando contra o descaso das políticas aos agricultores familiares e empreendedores familiares rurais. Os seguranças do local desviaram a saída do expediente dos funcionários. A previsão é que aconteça ao longo da semana mais atos desse tipo.
Ora se os servidores do MDA e do Incra são representantes do Governo, não caberia a sua presença como delegados. Se estão descontentes com seus salários o forum para reclamar é outro, eles são pagos para acompánhar e viabilizar os assentamentos, será que estão achando que são homens do campo?
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