terça-feira, 17 de junho de 2014

Duas táticas da policial-democracia na reação autoritária

por Rodrigo Barrenechea,
da Redação


  A Copa começou, os problemas empurrados para debaixo do tapete, e tudo está bem. Está mesmo? Ao mesmo tempo em que multidões de torcedores ocupam as ruas das cidades-sede da competição, diversos atos protestam contra os gastos excessivos, a corrupção e a repressão aos movimentos sociais. Algumas coisas não mudam: a grande imprensa diminui drasticamente o número de participantes, colunistas berram contra o "radicalismo" e inventam ligações entre partidos de esquerda, os Black Blocs e o crime organizado, isso para dizer o mínimo. Por outro lado, o governo faz malabarismo com os números e diz que os gastos da
Manifestante de São Paulo, mesmo imobilizado pela
 polícia, recebe spray de pimenta no rosto. (Foto: R7)
Copa não chegam nem perto do que se investe em educação e saúde. Como diz o jornalista esportivo Milton Neves, o Brasil deve ganhar todas as medalhas em "saltos orçamentais"...


  Contudo, em se tratando de táticas militares, algo mudou. Se em protestos anteriores, a polícia simplesmente terminava os atos jogando bombas ou gás de pimenta, agora seus métodos se sofisticam. Isso seria de se esperar, a repressão estuda seus "inimigos" e se ajusta a eles; só que vivemos - em tese - num Estado democrático, onde há o direito livre à manifestação.

Liberdade vigiada

  A mais nova tática das PMs é o cerceamento do direito de ir e vir dos atos. O primeiro exemplo desta inovação foi vista no protesto de 12 de junho em São Paulo, quando o ato organizado pela CSP-Conlutas e diversos sindicatos e movimentos sociais simplesmente não saiu do lugar. Marcado para começar na sede do sindicato dos Metroviários, no bairro do
PM de Minas Gerais cerca ativistas, impedindo que as
passeatas andem ou entrem em contato com o "público"
(Foto: Diego Franco | CSP-Conlutas/MG)
Tatuapé, o protesto simplesmente não conseguiu sair dali, impedido pela tropa de choque, que alegava ser a Av. Radial Leste, por onde passaria, "rota de acesso à Arena Corinthians". Quem conhece a cidade sabe que o local do ato era no extremo oposto da linha 2 do metrô em relação do estádio, não havendo chance do protesto chegar até o Itaquerão. A PM paulista chegou ao extremo de impedir que a passeata seguisse, fazendo os manifestantes se refugiarem no sindicato, e depois ameaçá-los caso não deixasse o prédio, como se fosse possível fugir pelos esgotos ou algo do gênero.


  Em Belo Horizonte, a tática vem se repetindo. Nos atos dos dias 12, 14 e 17 de junho, a PM cerca os manifestantes, impede que eles prossigam com a passeata ou façam suas panfletagens. Ou seja, os segregam da "população civil", o que deixa claro que a teoria do "inimigo interno" - negada pelo governo federal - está presente nas ações repressivas. É a guetificação dos protestos: os manifestantes são cercados, como num gueto, e isolados dos "torcedores" comuns. Isso sem contar que, após os atos, seus participantes vêm sistematicamente sendo revistados sem nenhuma causa provável.

Para quem não tem nada, metade é o dobro


  No Rio de Janeiro, no ato do 12J, tudo ia bem, sem maiores distúrbios. O protesto chegava aos Arcos da Lapa e se encaminhava ao seu fim. Até que, num dado momento, o Choque avança sobre os manifestantes e retira uma pessoa, aparentemente sem motivo. Minutos depois, o fato se repete. É claro que quem estava lá se revolta com as detenções, que aparentemente não tinham nenhum motivo. Os dois detidos que fui capaz de ver não estavam mascarados, não portavam armamentos nem instrumentos contundentes, ou praticaram algum
PM carioca imobiliza o primeiro dos presos durante o #12J no
Rio. O manifestante não parece ser Black Bloc ou portar
armamento. (Foto: Rodrigo Barrenechea)
tipo de vandalismo. Talvez tenham falado mal da mãe de algum dos PMs, mas isso não chega a ser estranho num ato como esse. Mas bastou o primeiro ser preso para que uma multidão de jornalistas e ativistas cercarem os policiais.


No segundo detido, um professor em greve, os ativistas avançaram para cima da PM, possivelmente pelo absurdo da prisão. Foi o motivo que o Choque precisava. Foi aquele carnaval de sempre: bombas de gás, pimenta, sirenes. Isso a poucas horas da estreia do Brasil na Copa.

  Parece que se pode tirar duas conclusões disso: quando o ato é menor, e a polícia se vê favorecida em número, impede-se o ato de andar. É a tática do cerco. Quando é maior, e tem mais visibilidade - pela presença da imprensa, seja os "midiativistas" ou veículos estrangeiros
12 policiais cercam um manifestante, professor em greve da
educação do Rio, enquanto outro tenta resgatá-lo.
(Foto: Rodrigo Barrenechea)
-, aí a tática é a da dispersão a qualquer custo, mesmo forjando supostos "flagrantes". Perto disso, a ação da Força Nacional de Segurança, ao avisar aos "srs. membros da imprensa" que bombas e balas de borracha seriam lançadas, parece de uma civilidade britânica. Para bola rolar em campo, fora dele a tática é a do vale tudo.

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