domingo, 14 de dezembro de 2014

Segundo dia do Seminário de Comunicação da CSP mostra experiências e aponta tendências para o jornalismo dos trabalhadores

Lei de acesso à informação, assessoria de imprensa e as experiências jornalísticas dos movimentos pelo Brasil foram os temas abordados neste sábado

por Sâmia Gabriela Teixeira(*), especial para a ANotA, 
e Rodrigo Barrenechea(**), de São Paulo

Neste segundo dia do 1º Seminário de Comunicação da CSP-Conlutas (13), a mesa que iniciou o dia de discussões trouxe como tema “Lei de Acesso à Informação e Cruzamento de Dados”. (*)


Fotos: Regina Gomesas
André Rosa de Oliveira, professor e especialista em novas mídias e tecnologias, apresentou exemplos teóricos e didáticos sobre as possibilidades que os infinitos dados armazenados na internet nos proporcionam, sobretudo para criar sistemas próprios de pesquisas e construir pautas diferenciadas que atendam às questões da classe trabalhadora.

Iniciando com a explicação de como funciona o sistema de redes da internet, André abordou a importância de saber utilizar os robôs para suprir capacidades sobre-humanas. “Não existe geração multitarefa. O cérebro não executa informações dessa maneira, mas a questão é sabermos como softwares, esses robôs, e ‘googles’, podem nos abrir caminhos”, sugere.


Tendo como alternativa o jornalismo de dados, André citou alguns exemplos de ferramentas criadas por grupos de comunicação, como o New York Times, com um laboratório de mídias que oferece informações baseadas em jornalismo de precisão,  e o The Guardian, que oferece o Open Plataform, um espaço que permite personalizar aplicativos que refinem dados para pesquisa.

Os obstáculos para obter dados públicos

Como parte da mesa tratava da Lei de Acesso a Informação, André também apresentou as dificuldades que órgãos públicos impõem ao disponibilizar os poucos dados de maneira que dificulte a avaliação das informações, publicando, por exemplo, imagens de documentos que impedem a compilação rápida de números ou outros pontos em tabelas para um possível cruzamento ou arquivamento de dados.

Por meio desta lei, governos da esfera nacional, estadual e municipal e órgãos ligados são obrigados a liberarem dados ao público. Mas há problemas com os dados publicados. “Temos a publicação ‘Manual de Dados Abertos’, que apesar de trazer dados do governo, não foi pensado por ele, mas sim pela W3C, que segue padrões da web mundo afora, mas o que é um dado legível, que possa ser compreendido pelas máquinas?”, questiona André, deixando para reflexão os meios de se buscar de modo mais efetivo os dados na internet. Para ele, o ideal é que os trabalhadores em comunicação e militantes que se interessem por temas específicos tenham como iniciativa a criação de uma própria data-base.

O primeiro passo

O que queremos?  Esta é uma pergunta, e bem difícil, colocada por André, que considera como passo inicial ter bem definido, quando se tem uma pauta em mãos, saber aonde ir atrás e assim buscar a informação necessária para fazer esta pauta, e evitar se perder em meio ao emaranhado de dados disponíveis na internet.

Além disso, para André, é necessário que saibamos como definir o perfil de nosso público. “Com quem estou conversando? Com quem quero conversar, dialogar? Que assuntos interessam a essa pessoas? Isso tem a ver com a vida da pessoa com quem vocês queira criar vínculos, e isso não é simplesmente classificar por gênero, cidade, idade”. 

Quanto aos infográficos e outras linguagens para a comunicação na internet, o professor alerta que, mesmo que saibamos utilizar outras ferramentas, fazer o trabalho de apuração e ter a sensibilidade que o jornalismo exige é fundamental. “As pessoas olham o infográfico e entende. Ok. Mas e se aquilo for mentira? Se for uma mentira deslavada? Temos como exemplo o jornal Folha de São Paulo, que recentemente publicou a notícia ‘Jornalismo profissional domina as redes sociais’, examinando apenas a quantidade de compartilhamentos de suas notícias nessas plataformas sem sequer avaliar se as publicações foram utilizadas como fonte de informação ou apenas com tom irônico ou negativo. Conhecer o perfil das pessoas com quem falamos é muito mais do que monitora compartilhamentos. Conversem com esse público”, concluiu.

Dicas de ferramentas aberta para o jornalismo de dados:

OpenRefine: Ferramenta utilizada para trabalhar com dados desorganizados, limpá-los e transformá-los de um formato para outro. É muito útil para encontrar casos isolados, anomalias e na filtragem de informação em geral. É também ideal para colocar planilhas separadas em uma só.

Infogr.am: Plataforma online que possibilita criar infográficos. Possui interface intuitiva e de fácil utilização, além de ter a opção de incorporar a mídia em blogs e sites.

FusionTables: Plataforma experimental para visualização de grandes conjunto de dados, uma nova opção para empresas que tentam interesse no compartilhamento de banco de dados na nuvem computacional do Google.

Many Eyes: Plataforma pública para explorar os benefícios da visualização de dados, levando em conta que essas informações entram diariamente e ficam sob controle da IBM, criadora do software. O sistema pode gerar visualizações com tabelas de dados cruzadas.

"A assessoria de imprensa: o que interessa às mídias" (**)

A segunda mesa, coordenada por Paula Máiran, presidente do Sindicato dos Jornalistas Profissionais do RJ, discutiu a relação entre os sindicatos e movimentos sociais e a grande imprensa, por meio das Assessorias de Imprensa e Comunicação. Participaram também do debate Bruna Barlach, da Vírus Planetário, Vinícius Caetano, do site UOL, e Simone Freire, do Brasil de Fato nacional.

Paula Máiran abriu a discussão com duas perguntas: Qual é o sentido das Assessorias de Comunicação? Por que se relacionar com a grande imprensa? Para os sindicatos, por exemplo, conseguir notícias pode não ser prioritário, mas é indispensável. "Não vamos disputar a linha editorial dos grandes veículos, vamos conseguir pouco espaço. Mas funciona sim, pode-se conseguir um aumento da visibilidade dos movimentos sociais", segundo ela.

Os movimentos sociais podem ainda não ter grandes mídias, como TV, mas podemos conseguir um pouco de espaço nestas. As grandes mídias não querem nos ignorar, mas nos enfrentar politicamente, "para nos invisibilizar, nos enfraquecer como classe trabalhadora". Precisamos nos qualificar nessa disputa, tornar-nos referência editorial, sabendo da força que a midia do grande capital. E isso envolve a disputa dos trabalhadores nos meios de comunicação.

A segunda questão levantada por Máiran versa sobre levar em consideração a conjuntura política, "nervosa no âmbito da esquerda". Quem é a referência discursiva para a classe trabalhadora? Há uma disputa com a CUT, por exemplo, que busca se requalificar na disputa editorial para a classe trabalhadora. A base política da CUT é a mesma da campanha eleitoral: unidade contra a direita e o golpismo. Outra forma é a tentativa do aparelhamento dos sindicatos dos profissionais de imprensa. Uma recente reportagem d'O Globo fala sobre ceticismo dos trabalhadores e sua relação com os sindicatos. A responsabilidade disso seria da própria classe e das novas direções sindicais. Na verdade, segundo Máiran, é a atitude conciliatória das antigas direções sindicais que criou esse ceticismo da classe trabalhadora.

Já Bruna Barlach, da Revista Vírus Planetário, começa citando Gramsci, sobre a importância dos jornais para a classe operária; qual é a importância da imprensa para o operário e porque os jornais da própria classe trabalhadora não conseguiam disputar terreno com a imprensa dos ricos.

Barlach conta como a Vírus surge nas Universidades há quase 7 anos, e consegue crescer como veículo de mídia contra-hegemônica. Seu funcionamento é como o de uma cooperativa, contrariando a lógica dos jornais, que costumam ter um "dono", responsável pela linha editorial. A ideia da Vírus é servir como uma ponte entre os movimentos sociais e o coletivo, tanto no aspecto político quanto financeiro. Outro aspecto importante da experiência da Vírus está na convivência entre diferentes correntes da esquerda socialista de forma amistosa.

Ainda sobre a relação entre sindicatos e imprensa, Barlach coloca que a proposta da Vírus é servir como pólo de atração de informações, tentando, de alguma forma, substituir a grande imprensa como meio de propagar notícias dos movimentos. Contudo, ela sabe das limitações da Vírus, que mesmo tendo uma revista impressa, site, redes sociais, WebTV, ainda é muito pequena perto dos grandes meios de comunicação capitalistas. Mas ela aposta na parceria com sindicatos e movimentos sociais como forma de driblar as dificuldades e poder crescer como veículo comprometido com as lutas da classe trabalhadora.

Vinicius Caetano, do site UOL, apontou a importância da relação entre trabalhadores e grande imprensa, afirmando que há espaço para as pautas sindicais em veículos como Folha de São Paulo o ou O Globo, com alguma distorção dos fatos, mas isso ainda sim é importante. Isso ocorre, especificamente, pela necessidade de noticiar greves ou lutas para um público que, de alguma forma, busca essas informações e, portanto, compra essas mídias. Não que essa imprensa esteja interessada em noticiar tais fatos, mas está mais interessada em vender, e se isso vende, que seja publicado.

Uma exceção apontada por ele nesta lógica é a Revista Veja, na qual ele trabalhou. Segundo Caetano, a Veja não apenas se recusa a buscar os vários lados da notícia, como deliberadamente distorce os fatos segundo sua linha editorial. Ele contou um exemplo da notícia da ocupação de uma fazenda da Cutrale, há alguns anos, onde ele tentou uma declaração do MST; seu chefe o interpelou, dizendo simplesmente que a Veja "não fala com o MST" e ponto.

Por fim, Simone Freire, da Brasil de Fato edição nacional, contou da experiência do jornal, composto por uma edição nacional, em formato standard, e 3 tablóides, Rio, Minas Gerais e São Paulo, sendo que este último deixou recentemente de ser publicado. Já são mais de 10 anos da publicação, tentando ir num sentido contrário da grande imprensa e noticiar o que os jornais tradicionais ignoram ou ocultam.

Ela começou fazendo uma autocrítica, pelo pouco espaço dado pelo jornal aos sindicatos e às lutas da classe trabalhadora. Isso se deve à reduzida equipe do jornal, de apenas 3 pessoas. No entanto, Freire aponta um dado interessante: a falta que ela sente de noticiar não apenas as lutas sociais - que sempre são pautadas pelos movimentos ao jornal -, mas da vida cotidiana dos trabalhadores, pelo que eles passam quando não estão exatamente em greve. Mais uma vez, ela aponta as dificuldades de uma equipe reduzida para não conseguir ir além das greves de momento. Uma coisa que ajuda o Brasil de Fato a melhor noticiar o que ocorre nas lutas sociais é a existência dos tabloides regionais, que contribuem com conteúdos locais.

"Apresentação e troca de experiências" traz contribuições de sindicatos e movimentos de todo o país (**)

A mesa abriu com a saudação de Soraya Misleh, do Comitê de Solidariedade com o Povo Palestino. Ela falou da importância da imprensa na luta por uma Palestina livre, no contexto dos conflitos com Israel e da rede internacional de solidariedade que se formou com a causa palestina.

A apresentação começa com o ANDES-SN. São 4 jornalistas, sendo um responsável direto pelo setor, além de Marinalva Oliveira, que é a diretora de imprensa do ANDES. O central nas pautas do setor são as notícias da categoria, seguindo-se notícias sobre educação, política em geral, direito à moradia, direitos humanos etc. A própria estrutura do sindicato - por meio de grupos de trabalho - se reflete na própria produção jornalística do ANDES. Tanto o site quanto o jornal semanal (Informandes) buscam refletir o noticiário da categoria, sendo agrupadas semanalmente num newsletter, o Informandes semanal. Além disso, conteúdos de produção visual, como virais e vídeos, são produzidos pelo setor de imprensa do sindicato. Uma revista acadêmica, a Universidade e Sociedade, é lançada semestralmente. Toda a produção jornalística termina sendo reproduzida pela página do Facebook e pela conta do Twitter. Por fim, está sendo construído um banco de dados virtual, o Repositório Digital do ANDES-SN, separado por data e coleção. O objetivo é agilizar a troca de informações e produtos entre o ANDES-SN e suas seções sindicais. Tudo isso foi construído por um plano de comunicação, aprovado pelo congresso sindical da categoria, e a formação de um grupo de trabalho conjunto entre dirigentes do sindicato e os profissionais da imprensa.

A seguir, Rodrigo Correa, coordenador de imprensa do Sindimetal-SJC, começou sua exposição com uma análise da categoria, que conta com cerca de 45 mil trabalhadores na base e perto de 15 mil filiados. São 5 jornalistas, um programador visual e alguns fotógrafos, que trabalham em regime de free-lance. Os veículos do sindicato são um jornal semanal - Jornal do Metalúrgico, com 22 mil exemplares de tiragem, uma revista trimestral - "O metalúrgico em família", com cerca de 30 mil exemplares. Há também jornais e boletins específicos, por empresa ou tema, o site do sindicato, além das redes sociais, um clipping diário da grande imprensa e uma assessoria de imprensa, que tenta incidir nos principais meios de informação, seja da região como nos grandes veículos nacionais. A programação em audiovisual não fica de fora, assim como cartazes, adesivos, banner, cartilhas, outdoors e, até mesmo, adereços de carnaval, que são usados no bloco mantido pelo sindicato. Uma sonora e uma matéria de notícias da TV Sindmetal-SJC foram mostrados. Correa, no final, mostrou alguns exemplares do Metalúrgico em Família, com uma pauta mais ampla e voltado especialmente às famílias dos trabalhadores.

Mara Roberta, diretora do Sindicato dos Servidores Públicos Municipais de Teresina-PI (SINDSERM), falou da equipe de trabalho do sindicato e mostrou algumas das publicações da página no Facebook, além da cobertura da participação do Sindserm em diversas atividades no Piauí ou em outros estados. Ela também trouxe a imagem do jornal do sindicato, além de outras publicações visuais. O jornalista do Sindserm, Luan dos Santos, apresentou o plano de comunicação sindical da entidade.

Bianca Pedrina, pelo departamento de comunicação da CSP-Conlutas, começou apresentando a estrutura do setor, com site, redes sociais, informes da Secretaria Executiva Nacional, o clipping da entidade, diversos materiais nacionais, uma assessoria de imprensa, a organização da comunicação interna da entidade e um site internacional, como parte da rede internacional de sindicatos que a CSP faz parte, em quatro idiomas. Bianca apresentou o site da central, onde há um atalho para o envio de materiais para as entidades filiadas e para o público em geral. Há também a organização das notícias por tema, uma galeria de fotos e uma seção de artigos de fôlego. Foi mostrado um perfil etário e de localização dos acessos do site, assim das origens dos acessos, se por meio das redes, das ferramentas de busca ou pelos links espalhados em outros sites.

A página de Facebook também foi exibida, mostrando um crescimento no número de curtidas nos últimos 18 meses. Já o Twitter é muito utilizado como um clipping, reproduzindo notícias de outras entidades e pessoas. Há também uma conta no Youtube e um serviço de clipping por email. Também foi apresentada a política interna de comunicação da CSP.

Entidades de todo o país também mostraram suas experiências

Outras entidades também apresentaram seu trabalho de comunicação, como o Sinasefe, Adufpel, Aduneb, Adusb, Aduff, Adufrj, Apug (Tocantins), Sintusp, Sintrajud, Sindtest, Sindicato dos Comerciários de Nova Iguaçu, Sinasefe Ifes-ES, Sindsef-SP, Sindipetro-SE/AL, Sindsifce, CSP-Conlutas PA, Adusc, CSP-Conlutas PE, MNOB, Sintest-RN, Sindicato dos Vigilantes-CE e o Sindicato dos Trabalhadores da Construção Civil de Belém-PA.

A partir da esquerda, os jornalistas Ademar Lourenço
 e Rodrigo Barrenechea da ANotA
A ANotA foi o único coletivo de mídia independente credenciado como participante do Seminário e apresentou seu trabalho, tanto nas redes sociais como na parceria com o Programa Censura Livre, de São Gonçalo-RJ. As propostas centrais da ANotA, como exposto pelos jornalistas Rodrigo Barrenechea, da sucursal Rio, e Ademar Lourenço, da sucursal Brasília, são de servir como pólo de captação e disseminação das notícias dos diversos sindicatos e movimentos, além de oferecer notícias, análises e produtos de mídia a essas mesmas organizações.

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