quinta-feira, 15 de junho de 2023

‘Eu estava nos atos de junho de 2013 e não me arrependo disso’


Fotos: Reproduções/
Texto: Ademar Lourenço*

“Daqui a cem anos o dia de hoje será feriado”. Nunca me esqueço de ter disso isso em 17 de junho de 2013. A foto de baixíssima qualidade em cima do Congresso Nacional que está aqui embaixo foi tirada por mim. Esse é um relato em primeira pessoa e não poderia ser diferente. E, sim, subi no Congresso Nacional naquele dia.

Muita coisa sobre junho de 2013 está sendo dita por gente que não estava lá e pesquisou pouco. Ou por quem deixou o trauma de tudo o que veio depois apagar algumas memórias. A violência policial foi o estopim. O ato que ocupou o Congresso e gerou a imagem que vai para os livros de História foi convocado com o nome de “Marcha do Vinagre”. Era uma referência à prisão de um jornalista da Carta Capital preso em um ato anterior. Seu “crime” era portar vinagre para reduzir os efeitos do gás lacrimogênio.


Em junho de 2013, 44% da renda das famílias estava comprometida com dívidas, de acordo com dados do próprio Banco Central. O aumento do consumo nos anos anteriores foi bancado em parte pelo acesso fácil ao endividamento e a bolha havia estourado. Nos seis meses anteriores aos atos, o tomate e a farinha de trigo haviam dobrado de preço. O crescimento da economia brasileira já dava sinais de desaceleração. Não foi apenas a classe média privilegiada que foi para as ruas.

Eu não vi nas redes sociais, eu não li nos jornais, eu estava lá


Eu vi o metrô na estação da Praça do Relógio, em Taguatinga, lotado de jovens vindos de Ceilândia, periferia do Distrito Federal, rumando em direção ao ato. Eu me lembro daquele fim de tarde na Rodoviária de Brasília. Ao invés de voltarem para casa, as pessoas subiram para a Esplanada dos Ministérios. A Brasília “ilha da fantasia” era invadida pelo Distrito Federal dos trabalhadores.

Eu vi um jovem militante socialista puxar um coro repetido por dezenas de milhares de pessoas, fato que rendeu o primeiro vídeo viral dos atos. “Só vamos parar quanto a gente colocar um milhão, dois milhões, três milhões, vinte milhões aqui para falar que não está certo o que eles fazem”. Era o que ele dizia, sendo repetido pela multidão, que ao final gritava o bordão “Amanhã vai ser maior”. O jovem de 10 anos atrás continua defendendo o socialismo em 2023, mas está mais ocupado trabalhando como servidor público.